14 October 2011

Distribuir o mal pelas aldeias

Ontem li com grande interesse as intenções do governo em relação aos funcionários públicos. A grande notícia são os cortes nos subsídios de Natal e de férias (equivalentes a 2/14 do ordenado anual, ou seja uma redução bruta de 14.3%). Quando li isto pensei que finalmente batemos no fundo.

Mas depois lembrei-me do que fez o Governo do país onde vivo. Para reduzir a conta dos ordenados dos funcionários públicos o Governo Inglês foi mais radical e em vez de distribuir o mal pelas aldeias, decidiu cortar a direito e está a mandar na casa de 610 mil funcionários públicos para a rua. Sim, leram bem, mais de meio milhão de pessoas. Quase tantas como a totalidade do sector público Português.

Tendo de cortar na despesa com funcionários públicos, as opções do Governo PSD/CDS eram claras: ou cortavam nos salários, ou cortavam nas pessoas. Optaram por cortar 14% do vencimento de cada funcionário, em vez de enviar 14% de todos os funcionários para o desemprego. Era essa a grande decisão. Não tenho a menor dúvida de que o Governo queria mesmo fazer era despedir esses 14% (ou mais), mas não o fez com medo de uma contestação ao nível da Grécia. Vai haver protestos na mesma, ninguém se engane, mas as pessoas vão continuar empregadas e pessoas com trabalho têm menos tempo para protestar do que desempregados. A aritmética foi óbvia.

Na minha opinião perdeu-se uma oportunidade histórica e em termos motivacionais foi a decisão errada. Não tiveram a coragem de fazer o que devia ser feito (uma restruturação a sério de todos os serviços, assumindo as redundâncias necessárias) e por isso em vez de o resultado ser um grupo de desempregados descontentes mas uma função pública mais eficiente, vamos acabar com a mesma função pública de antes mas em que literalmente todos os funcionários estão descontentes.

Ainda por cima como estes cortes são supostamente temporários não se resolveu o problema de longo prazo, logo os cortes ainda não acabaram e a coisa não vai ficar por aqui.

4 comments:

  1. Compreendo o que dizes - sobretudo porque eu também acho que temos uma Administração Pública demasiado grande, cara e ineficiente. Também acho que a temos que cortar fortemente. Mas não tenho a certeza que produzisse os efeitos desejados neste momento. E deixa-me explicar porquê:

    1. Consumo das Famílias - um corte de 14% no salário de funcionários públicos tem um efeito travão menor no consumo que um corte de 14% no número de funcionários públicos. Ou seja, um efeito menos gravoso em termos de PIB, impostos colectáveis e desemprego. E, portanto, em termos de défice público.

    2. Subsídio de desemprego - se o Estado despedisse agora 14% dos funcionários públicos, teria que lhes pagar subsídios de desemprego por um período entre 6 meses e 1 ano. Ou seja, o efeito de curto prazo que está a ser procurado seria próximo de 0.

    3. Mix de gastos - um dos problemas portugueses (e que ninguém duvide que isto está tudo ligado) tem a ver com a Balança Comercial extremamente deficitária. Cortar 14% dos salários irá incidir mais no consumo de produtos importados (mais caros e, em muitos casos, menos essenciais) do que se o corte fosse feito em número de funcionários públicos.

    Que ninguém duvide, temos que tornar o Estado mais eficiente já! E liberal! Mas, estamos a caminhar sobre uma linha muito ténue.

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  2. Boa análise. As coisas precisam de serem mudadas.
    Mas fica sempre aquela questão: que fazer a tantos desempregados (seja na tugalandia, que na englandia)?

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  3. Apoiado Bernardo.
    E sim, o desemprego custa tanto como manter o emprego artificialmente e ainda muito mais que um estado que suga dinheiro e pessoas, que podiam estar a produzir noutro lado... Ou será que em Portugal há uma raça humana que só serve para ser funcionário publico?

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  4. E a resposta do Ministro das Finanças (que parece ser feita de propósito para este post) - http://economia.publico.pt/Noticia/alternativa-aos-cortes-nos-subsidios-seria-despedimentos-diz-vitor-gaspar-1517002

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